09 julho 2008

Criatividade

Esta redação feita por uma aluna do curso de Letras, da UFRJ, que venceu um concurso interno promovido pelo professor titular da cadeira de Gramática Portuguesa.

Redação:

Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se
encontravam no elevador. Um substantivo masculino, com um aspecto plural,
com alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. E o artigo era bem
definido, feminino, singular: era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal.

Era ingênua, silábica, um pouco átona, até ao contrário dele: um
sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanáticos por leituras e
filmes ortográficos. O substantivo gostou dessa situação: os dois sozinhos,
num lugar sem ninguém ver e ouvir. E sem perder essa oportunidade, começou a
se insinuar, a perguntar, a conversar.

O artigo feminino deixou as reticências de lado, e permitiu esse
pequeno índice. De repente, o elevador pára, só com os dois lá dentro:
ótimo, pensou o substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns
sinônimos. Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o
elevador recomeça a se movimentar: só que em vez de descer, sobe e pára justamente no andar do substantivo. Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela em seu
aposto.


Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma
fonética clássica, bem suave e gostosa. Prepararam uma sintaxe dupla para
ele e um hiato com gelo para ela. Ficaram conversando, sentados num
vocativo, quando ele começou outra vez a se insinuar.

Ela foi deixando, ele foi usando seu forte adjunto adverbial, e
rapidamente chegaram a um imperativo, todos os vocábulos diziam que iriam
terminar num transitivo direto.

Começaram a se aproximar, ela tremendo de vocabulário, e ele sentindo
seu ditongo crescente: se abraçaram, numa pontuação tão minúscula, que nem
um período simples passaria entre os dois. Estavam nessa ênclise quando ela
confessou que ainda era vírgula; ele não perdeu o ritmo e sugeriu uma ou
outra soletrada em seu apóstrofo. É claro que ela se deixou levar por essas
palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para o comum
de dois gêneros.


Ela totalmente voz passiva, ele voz ativa. Entre beijos, carícias,
parônimos e substantivos, ele foi avançando cada vez mais: ficaram uns
minutos nessa próclise, e ele, com todo o seu predicativo do objeto, ia
tomando conta.

Estavam na posição de primeira e segunda pessoa do singular, ela era um
perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu
grande travessão forçando aquele hífen ainda singular. Nisso a porta abriu
repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo,
e entrou dando conjunções e adjetivos nos dois, que se encolheram
gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas.. Mas ao ver
aquele corpo jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o verbo
auxiliar diminuiu seus advérbios e declarou o seu particípio na história.


Os dois se olharam, e viram que isso era melhor do que uma metáfora por
todo o edifício. O verbo auxiliar se entusiasmou e mostrou o seu adjunto
adnominal.

Que loucura, minha gente. Aquilo não era nem comparativo: era um superlativo
absoluto. Foi se aproximando dos dois, com aquela coisa maiúscula, com
aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos. Foi chegando cada
vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo,
propondo claramente uma mesóclise-a-trois. Só que as condições eram estas:
enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio do substantivo,
e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.

O substantivo, vendo que poderia se transformar num artigo indefinido
depois dessa, pensando em seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na
história: agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, jogou-o pela janela e
voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo
feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva.

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